Por Leandro Resende – CNN Brasil – 07/04/2020
Sentimentos inerentes à quarentena, a solidão e a angústia terão outra intensidade para Luciana dos Santos Nogueira, 42 anos, e seu filho Davi, 8, nesta terça-feira (07), dia em que se completa um ano da morte do músico Evaldo dos Santos Rosa, alvo de mais de 200 tiros disparados por militares do Exército na Zona Norte do Rio.
No dia 7 de abril de 2019, um domingo, Evaldo era o motorista no carro que levava Luciana, o filho Davi, o sogro e uma amiga para um chá de bebê. Na altura de Guadalupe, na Zona Norte do Rio, o veículo foi alvo dos fuzis e das pistolas dos militares que acharam se tratar de um assaltante. Evaldo e o catador de materiais recicláveis Luciano Macedo, que estava no local e tentou ajudar a família, morreram. 12 militares respondem em liberdade pelo crime – eles alegam que reagiram a um assalto e que o catador Luciano estaria armado.
Um ano depois daquele domingo, Luciana se emociona ao falar do que viveu no período. Sem o apoio dele, que atuava como segurança e músico, ela se equilibrava até o mês passado em dois empregos como técnica de enfermagem.
Foi demitida de um deles, mas segue na ativa no outro, na linha de frente do combate ao coronavírus. Ao lado do filho, sofre ao lembrar daquele dia. “A quarentena é desesperadora. Meu filho fica arrasado, às vezes agressivo, chora o choro constante e cortante de quem está preso. Pra mim, aumenta a ansiedade e penso ainda mais na falta que o Evaldo faz”, relatou Luciana.
As lembranças da casa em que a família morava foram tão duras que, desde aquele domingo, eles não moram mais lá. Hoje vivem juntos em um apartamento, enquanto aguardam o pagamento integral da indenização determinada pela Justiça Federal do Rio. De acordo com a decisão, a União deve pensão de R$ 2,3 mil ao filho de Evaldo.
Luciana reclama que o Exército jamais entrou em contato com ela para pedir desculpas pela morte de seu marido. “Agora (em março deste ano) recebi um terço do valor que deveria ter recebido. Preciso pagar tratamento psicológico para o meu filho, e não tenho perspectiva de nada”, desabafou.
Evaldo e Luciana viveram juntos por 27 anos – quando ele morreu, faltavam apenas três prestações para quitar o carro, destruído pelas balas disparadas pelos militares do Exército. “Se eu pudesse falar com esses rapazes, pediria apenas que contassem a verdade. Eles sabem que o Evaldo era pai de família e que a história que eles contam sobre o dia 7 de abril de 2019 não corresponde ao que aconteceu. Queria que eles soubessem que eu era uma mãe – agora sou mãe e pai, sozinha, sem o meu melhor amigo”, resumiu Luciana.
O processo que investiga os militares pela morte de Evaldo e Luciano corre em segredo de justiça. Há expectativa de que a sentença saia ainda neste ano.