Gustavo Silva – Jornal Extra – 29/07/2023
A volta do bônus de produtividade do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), ressuscitado pelo governo federal há duas semanas, tem sido um ponto conflitante entre entidades e sindicatos representantes dos servidores federais. A medida, assinada pelo ministro da Previdência Social, Carlos Lupi (PDT), e pelo novo presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, tem sido alvo de críticas e elogios dos funcionários públicos.
Alguns deles afirmam que a bonificação é a medida mais efetiva a curto prazo para resolver a fila de 1,8 milhão de pedidos de benefício à espera de análise pelo INSS. Outros, porém, dizem que o já defasado quadro de pessoal do instituto vai adoecer com o aumento de carga de trabalho. O governo, como era de se esperar, defende o pagamento, mas não esclarece questões cruciais para o combate à fila e a falta de estrutura.
Segundo o Ministério da Previdência Social, o objetivo é incentivar os servidores a analisarem mais requerimentos, a fim de diminuir a fila de espera por benefícios. O programa já havia sido testado antes, mas foi extinto em 31 de dezembro do último ano, quando acabou o prazo inicial estabelecido por lei. O atual presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, informou que o impacto orçamentário da medida será na casa dos R$ 130 milhões.
O Programa de Enfrentamento à Fila da Previdência Social (PEFPS) — como foi batizado — instaura o pagamento do bônus calculado de acordo com o desempenho dos servidores (que realizam as análises de requerimentos) em relação às metas estabelecidas pelo INSS para eles.
Esses indicadores incluem a quantidade de pedidos analisados dentro de um determinado período e a redução do tempo médio de análise de benefícios, entre outros critérios relacionados à eficiência e à celeridade dos serviços.
Para aumentar o burburinho em torno do programa, para que os servidores possam passar a receber o bônus, eles terão que “pagar um pedágio” de 30% na produção. Isso significa que, ao bater a meta mensal, que garante o pagamento do salário, o funcionário do INSS terá que produzir um extra de 30% para que, então, passe a estar apto ao recebimento do bônus. Essa ação é inédita na história dos mecanismos de redução da fila do INSS.
O instituto estabeleceu dois incentivos às análises. O primeiro é destinado aos médicos peritos; o segundo, aos outros servidores do órgão. Ao primeiro grupo, o valor do pagamento será de R$ 75 por perícia. Os demais receberão R$ 68 por pedido analisado. O bônus não será valido para cálculos de aposentadoria e benefícios.
Entidades avaliam em dissonância
Nem tanto ao céu nem tanto ao inferno. É a visão que a maioria dos sindicatos e das entidades representativas dos servidores têm da Medida Provisória (MP) 1.181, que instaurou o bônus, entre outras medidas que não dizem respeito ao INSS. O presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil, Vilson Romero, diz que as medidas emergenciais para tratar da fila do INSS não são de hoje, mas não trouxeram resultados esperados.
– O número da fila se mantém há anos, mesmo com as ações — afirma.
O entendimento de outras organizações, como a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social (Fenasps), é o de que a bonificação não funciona. Viviane Peres, presidente do grupo, disse que o bônus vai adoecer os servidores, por aumentar a pressão por produtividade de um contingente cada vez mais envelhecido e sem estrutura.
– Medidas paliativas não dão conta de uma problemática de grandes proporções e sem resolução fácil.
João Paulo, secretário da Central de Trabalhadores do Brasil, diz que a crise poderia ter sido evitada, se o governo ouvisse as centrais sindicais:
— Os técnicos não sabem as implicações desse tipo de medida provisória.
Esperança de solução para o problema
Da parte das entidades que veem aspectos positivos na implementação do bônus de produtividade no INSS, o principal argumento é o de que a ação governamental mostra interesse na resolução do problema. Alexandre Lisboa, presidente da Associação Nacional dos Servidores Públicos, da Previdência e da Seguridade Social (Anasps) destaca que houve negociações avançadas com a União para o “extermínio da fila”.
— Discutimos também a melhoria nas carreiras, com um melhor reconhecimento salarial e estrutural dos servidores — salienta.
Há duas semanas, em pronunciamento, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi categórico: “Já provamos que podemos zerar a fila. Ela não precisa existir”.
Rolando Medeiros, diretor do Sindicato dos Trabalhadores Federais em Saúde e Previdência no Estado do Rio (Sindsprev/RJ), diz que somente com o comprometimento da União em abrir novos concursos a “chaga” do instituto pode ser sanada.
Segundo um levantamento feito pelo EXTRA, além dos mil convocados do último concurso para técnico do seguro social (de nível médio), há quatro mil aprovados à espera de convocação. O INSS admite a possibilidade de chamar mais dois mil. O ingresso de cinco mil novos servidores qualificados, porém, ajudaria muito.
Glauco Wamburg, ex-presidente do INSS, considera que é preciso criar mecanismos para ampliar a produtividade dos servidores do instituto:
— Essa medida, essa resposta foi focada na sociedade, que precisava de uma resposta efetiva.
Defasagem no quadro de pessoal
Segundo Juliana Teixeira, especialista em Direito Previdenciário do João Tancredo Escritório de Advocacia, a bonificação, na prática, nem sempre gera bons resultados:
— O bônus de produtividade acaba representando em uma falsa eficiência e leva prejuízo aos segurados.
Dadas todas as ponderações, um problema citado por todas as entidades é a falta de pessoal no instituto. Nos últimos dez anos,houve redução de cerca de 30% no efetivo do INSS — seja por morte ou aposentadoria. Em ambas as causas, o envelhecimento e a falta de reposição dos quadros do instituto revelam um problema a ser vencido.
Junto a isso, o consequente envelhecimento da população brasileira, como mostrou o Censo Demográfico, e o aumento dos pedidos feitos ao INSS fez com que, no mesmo período de perda de pessoal, o órgão tivesse a carga de trabalho quase duplicada — chegando na casa dos cinco milhões de processos de todas as naturezas.
O INSS ressalta que nenhum servidor é obrigado a aderir ao Programa de Enfrentamento à Fila da Previdência Social (PEFPS): “O sentimento é o de que os próprios funcionários estão incomodados com as decisões tomadas pelo antigo governo, que levou a fila ao patamar atual”.